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Kammal João
Cadernos e caminhos

Kammal João já gostava de desenhar quando ganhou seu primeiro caderno aos 15 anos, de sua mãe. Desde então, cadernos e desenhos fazem parte de sua vida, acompanhando o artista nos ônibus, nas padarias, salas de espera e especialmente em viagens. “São praticamente 15 anos que levo cadernos para todos os lugares para onde vou, sempre desenhando”, diz.
Os cadernos foram inclusive a fonte para a sua tese de graduação em Design Gráfico na PUC-Rio. “Na época eu estava lendo Cartas a Theo, a correspondência que o pintor Van Gogh manteve com o seu irmão ao longo da vida. Daí veio a ideia de criar um projeto que daria aos meus cadernos e desenhos o formato de cartas”, diz.

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Arquivo pessoal

Endereçadas ao seu irmão Amir, que na época tinha 7 anos, as cartas ilustradas de Kammal -- mais de 150 -- foram escritas e desenhadas entre agosto de 2010 e fevereiro de 2011, durante uma viagem solitária que ele fez pelas regiões centro-oeste, norte e nordeste do Brasil. Essa história virou um lindo livro, O tempo sem tempo, publicado em 2015 pela A Bolha Editora.

Segundo Kammal, esse projeto o ajudou a se aprofundar na parte gráfica dos registros, na relação texto/imagem e em diferentes técnicas. “Mas sentia que ainda havia algo além, que era a própria forma como as coisas eram percebidas antes de serem registradas. Fui desenvolvendo uma curiosidade por esse desenho antes do desenho por assim dizer”. Decidiu então estudar as relações da sensorialidade com o corpo pelo olhar da clínica, e seguiu para uma pós-graduação em Psicomotricidade Somática: “Foi um mergulho fascinante de 3 anos, que me fez descobrir a vontade de trabalhar com grupos”, diz. Esse desejo ficou mais forte quando Kammal encontrou Júlio Lage, que já organizava viagens de experiência: “Juntamos os pontos e idealizamos os Cadernos & Caminhos”, conta.

Atualmente, Kammal concilia seu trabalho como professor de desenho -- no Parquinho Lage e na Escola Parque -- às viagens do projeto Cadernos & Caminhos. “Em dois anos, já viajamos com dois grupos para Igatu, na Chapada Diamantina, fizemos uma travessia pelo Vale do Pati, também na Chapada, e ainda fomos para Três Picos, na serra do Rio, e Terra Una, uma ecovila em Minas Gerais”. Nessas viagens, além de Kammal e Júlio, há sempre convidados especiais que compõem os encontros e olhares das mais diversas formas. “O projeto é sobre desenho e registro, mas também é a construção de uma experiência comum de convívio e troca. Buscamos construir um espaço do qual o sensível faça parte. A contemplação, o tempo, a alimentação, tudo passa a ser importante. Estamos de algum modo investigando o que chamo de desenho antes do desenho. Apesar de todos os dias terem dinâmicas específicas ao desenho, propomos também práticas de corpo e estamos sempre atentos às sensações. Desse modo, o ato de desenhar torna-se algo muito mais amplo, que começa bem antes do traço no papel”, explica.

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Para o Lugar de Ler, Kammal preparou uma versão urbana do Cadernos & Caminhos: “Em São Paulo, pretendo seguir de forma bem semelhante ao que faço nas viagens, mas compondo com o contexto da cidade. A ideia, antes de cada exercício de desenho, é ter uma vivência que se relacione com ele de forma mais ampla. Isso é, que traga para a escala do corpo algo daquele pequeno gesto que vamos realizar no desenho. Respiração e pé no chão são bem-vindos para começar nossos dias, e aos poucos vamos nos aproximando das imagens, construindo esses estados antes de se chegar ao desenho”, diz Kammal.

Em outubro ele fará uma exposição na galeria IBEU, no Rio, quando apresentará uma coleção de noventa desenhos, que são parte de um possível próximo livro que se relaciona com O tempo sem tempo. “Estou animado para ver esses desenhos no mundo”, diz.

Imagem do livro O tempo sem tempo

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