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Júlia Contreiras

Narrativas gráficas no livro-objeto artesanal

Quando estagiou na Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin, na Universidade de São Paulo, Júlia Contreiras se viu no meio de muitos livros raros e logo se apaixonou pela materialidade e infinitude de formas desses exemplares. Com acesso a grandes clássicos da literatura brasileira e a impressos originais de edições limitadas do Gráfico Amador (uma editora artesanal de Recife que atuou nos anos 1950), a estudante da FAU - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo - logo começou a fazer relações entre design gráfico, trabalho artesanal e o objeto-livro.

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Arquivo pessoal

Júlia decidiu então buscar mais referências para sua formação nessa área. Fez algumas disciplinas de xilogravura na ECA-USP, um curso de gravura no SESC Pompeia, uma disciplina optativa de linguagem e semiótica e, com tudo isso, chegou ao seu tema de trabalho de conclusão de curso: o livro artesanal, os tipos móveis, a xilogravura, a encadernação, tudo amarrado com a poesia. “Desenvolvi todo o projeto no Laboratório de Programação Gráfica da FAU, um lugar precioso que guarda um grande acervo de tipos móveis e máquinas gráficas antigas. Foi lá que me debrucei, durante seis meses de trabalho, na produção de vinte livros de poesia, todos compostos em tipos móveis de chumbo e ilustrados em xilogravura. Desde então, busco sempre uma solução artesanal, unindo técnicas gráficas tradicionais às contemporâneas”, diz.

Em 2015, no último ano no curso de design, ela começou a trabalhar como assistente da designer editorial Luciana Facchini. “Com ela entrei no mundo atual do livro, das editoras, projetos, produção gráfica e tudo o que compõe esse mercado complexo. Desde então, tenho me dedicado profissional e artisticamente às artes do livro e, principalmente, à pesquisa da experimentação gráfica por meio desse objeto no contexto de publicações independentes”, conta.

Preocupada em difundir as práticas artesanais na criação do objeto-livro, desde 2016 ela ministra pequenas oficinas e cursos para um público interessado nesse universo. “Fui responsável por dois cursos na Oficina Cultural Oswald de Andrade, onde foi possível aplicar métodos usando diretamente os materiais gráficos, o papel, a narrativa. Nesse sentido, estou desenvolvendo um novo projeto de pesquisa acadêmica, a fim de explorar e sistematizar as novas abordagens de ensino da feitura do livro por meio do patrimônio gráfico, principalmente nas universidades públicas e cursos de design gráfico, que valorizam a prática tanto quanto a teoria”, diz.

Júlia também faz parte do coletivo Atalho Gráfico, produzindo gravuras, principalmente xilo, em diversos formatos, e explorando os limites da técnica e sua aplicações. “Com projetos como Impressões Urbanas e os dois primeiros números da Matriz Revista, participamos constantemente das feiras de publicações independentes de São Paulo, buscando sempre trabalhar graficamente os assuntos latentes da contemporaneidade política, sexual e cultural. Na última feira Printa, no SESC 24 de Maio, participei de uma fala sobre o processo criativo do livro Rastros do Massapê, da Editora Quelônio, o qual ilustrei com a técnica da xilogravura”.

O atual movimento das feiras e eventos de publicações independentes é, inclusive, um sinal para Júlia de que, em diversas cidades do Brasil, principalmente em São Paulo, começam a existir a valorização e a retomada das técnicas artesanais de impressão e encadernação por parte de designers, artistas, escritores e editores. “É ainda algo recente, mas que pode apontar para um reconhecimento do processo de projetar e de um olhar mais cuidadoso e criativo para a produção do livro nas suas mais variadas formas e áreas temáticas”, diz. No meio independente, os olhos e intenções estão voltados para a produção de livros (e suas variantes) de alta qualidade estética e material. “Vejo nessas iniciativas uma tentativa de reabilitação do impresso a partir da lenta consolidação de grupos e editoras. Acredito nessa força motivadora de criação, que vem impulsionando escritores, artistas, designers e editores a participar de feiras em busca de um espaço de troca e legitimação. Por fim, vejo nessa produção atual abundante o surgimento de uma nova visualidade do objeto-livro e dos modos de produzi-lo”, diz.

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