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A alma perdida

de Olga Tokarczuk e Joanna Concejo

Leitura de Janette Tavano

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Alguns anos atrás, uma amiga me contou que sempre se sentia muito mal quando chegava em outro país depois de uma longa viagem de avião. Precisava de pelo menos um dia para se recuperar. Não era apenas um cansaço causado pelas horas de espera em aeroporto e o leva e traz de malas. Era algo bem mais incômodo, que a deixava completamente sem energia, tanto que decidiu falar do problema com seu médico. O diagnóstico foi uma surpresa. Ele disse que a sua alma não acompanhava a velocidade do avião e que ela realmente precisava descansar um dia inteiro após a viagem para se sentir melhor. Na época, achei aquilo um grande absurdo, quase uma piada  – como assim, a alma não acompanha o corpo? 

Quando li A alma perdida, da escritora polonesa Olga Tokarczuk, vencedora do Prêmio Nobel de Literatura, imediatamente lembrei desse episódio e da minha desconfiança em relação ao diagnóstico dado por aquele médico. Mas hoje, ao contrário, admito que há momentos em que o corpo pode realmente perder sua alma. Sem nem mesmo precisar entrar num avião. 

Olga fala disso com maestria: sensível na medida certa, sem um pingo de pieguice.

E as lindas ilustrações da também polonesa Joanna Concejo, vencedora da Menção Especial do Prêmio Bologna Ragazzi 2018, transformam a obra em um livro-álbum atemporal e para todas as idades.

A história fala de um homem que trabalhava sem descanso, sempre com pressa, e que já havia esquecido sua alma em algum lugar bem distante. Mas não se dava conta disso. Porque a vida seguia, ele dormia, comia, jogava tênis, trabalhava. Só não via graça em nada. 

“Ele tinha a impressão de que tudo a sua volta ficara plano e sem graça, como se ele se movimentasse numa folha quadriculada e vazia de um caderno de matemática, coberta por quadradinhos iguais e onipresentes”, escreve Olga em uma página com um fundo preenchido por quadradinhos iguais e onipresentes.

Um dia, depois de uma viagem, quando esse homem mal podia respirar dentro de um quarto de hotel, ele já não sabia mais onde estava, o que fazia ali nem qual era seu nome, “como se já não houvesse ninguém dentro de seu corpo”.

Procurou então uma médica, “mulher velha e sábia”, e o diagnóstico foi que ele havia perdido sua alma pelo caminho. 

“Você precisa achar um lugar só para si, sentar-se e aguardar com paciência a sua alma”.

As ilustrações contam quase que de forma independente a história desse homem em busca de sua alma - ou da alma em busca do homem - , em duplas que seguem umas depois das outras com apenas uma palavra ou até sem nenhum texto.

As imagens colocam o leitor para dentro da história aos poucos. Logo no início, se tem uma vista aérea de um parque coberto por neve, onde é possível ver árvores sem folhas, pessoas pequeninas, pegadas no chão. A ilustradora, então, começa a nos carregar para cada vez mais perto desse mundo, até nos aproximar dos bancos onde estão sentados casais, mães e filhos, crianças, idosas com cachorros. Momentos corriqueiros em um parque. Mas os tons, ora sépia ora azulados, fazem tudo parecer antigo, momentos que ficaram para trás. 

A partir dessa paisagem invernal, o leitor passa a acompanhar a história atravessando vários cenários. Vê pessoas, animais, plantas, o mar, o céu. 

Sem pretensão de dar respostas, o livro é uma bela fábula dos tempos atuais. 

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A alma perdida

Texto: Olga Tokarczuk

Ilustrações: Joanna Concejo

Tradução: Gabriel Borwski

Editora Todavia

Isbn 978-65-5692-064-1

48 páginas

19,5 x 26,4 cm

Livro-álbum

Para leitores de todas as idades

R$ 48,00

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