Milágrimas, de Alice Ruiz S e Luli Penna
Leitura de Janette Tavano
A poeta e letrista Alice Ruiz disse no lançamento do livro Milágrimas que o artista tem o compromisso de falar sobre a essência das coisas. E que mesmo que a literatura seja ficção, ela precisa ter uma verdade para conseguir atravessar o tempo e permanecer. Seu poema “Milágrimas” é um bom exemplo disso: escrito há 30 anos, continua tocando as pessoas com a mesma intensidade. Porque ele fala da dor. Mas não só. Fala da transformação. Porque para a poeta é necessário falar da tristeza, mas é mais importante oferecer uma saída para ela.

Talvez seja essa a potência desses versos que foram lindamente musicados por Itamar Assumpção em 1990 e que vêm sendo cantados por várias mulheres de lá para cá: Anelis Assumpção, Ná Ozzetti, Zélia Duncan, Anna Toledo, Alzira Espíndola e Rogéria Holtz. O poema também foi referência para o espetáculo “Milágrimas”, de Ivaldo Bertazzo, em 2005. Agora virou livro. Publicado pelo selo o.Tal, da Editora Caixote, Milágrimas é apresentado ao leitor logo na orelha como um poema-letra-canção-quadrinhos-mantra-livro-ilustrado. O momento do lançamento não podia ser mais apropriado: final de 2020, o ano em que um vírus nos confinou em nossas casas, com medo, longe uns dos outros, sem abraços nem beijos, próximos apenas pelas telas de computadores e celulares, chorando pelas nossas dores e pelas dores do mundo.

O verso “A cada mil lágrimas sai um milagre” ganha então a força de um desejo: choramos muito, mas acreditamos na transformação. Daí os editores apresentarem Milágrimas também como um mantra.

Quem traduziu o poema em imagens foi Luli Penna, ilustradora e cartunista, autora da graphic novel Sem dó (Todavia). Também criada em quadrinhos, a narrativa visual de Milágrimas começa com a chuva e, a cada quadro, o leitor vai se aproximando da personagem, única a não se proteger das gotas. Ela chega em casa – no edifício Cinderela – e está sozinha. Assim que começa o texto, fica quase impossível ler os versos desacompanhados da melodia de Itamar, que ressoa em nossas mentes enquanto viramos as páginas, seguindo com calma as imagens detalhadas de Luli. O marcador, ilustrado com lágrimas, é quase uma página à parte, que percorre todas as outras. As lágrimas marcando e acompanhando a história. Até que se chega aos versos mais bonitos do poema:
“mas se apesar de banal
chorar for inevitável
sinta o gosto do sal
gota a gota
uma a uma
duas, dez, cem mil lágrimas
a cada mil lágrimas
sai um milagre”
Milágrimas é um daqueles livros para todas as idades, gêneros e épocas. É, especialmente, para aqueles que acreditam nas transformações.

Milágrimas
Texto: Alice Ruiz
Narrativa visual: Luli Penna
Editora o.tal
Isbn 978-65-86666-02-1
48 páginas
15,5 x 21,5 cm
Livro-álbum
Para leitores de todas as idades
R$ 42,00